As lideranças e as suas estratégias

Na política somos confrontados permanentemente com duas linguagens: a dos vencedores e dos vencidos. Nos regimes democráticos trabalhamos o diálogo numa relação de compromisso feito pela reação institucional promovida pelas lideranças que temos em cada ciclo. E assim avaliamos a qualidade da democracia que somos e construímos, tendo em vista o bem comum.

Os tempos estão no entanto caldeados por nuvens de hostilidade que confundem quem quer perceber o que se passa e fica para análise com um conjunto de falas, decisões e motivações que mais não são que expressões de radicalismo. E percebe-se a tendência: o “esclarecimento” de quem manda impõe-se a quem duvida.

Nestes momentos apela-se à negociação tendo em vista um compromisso que acautele o interesse e a estabilidade política e disso resulte m ambiente social que prime na defesa da estabilidade.

Durante o PREC tivemos seis governos provisórios entre 1974 e 1976. Era a revolução em marcha e o registo ficou explicado. Contudo o balanço geral refere que em 50 anos de democracia Portugal já conheceu 30 Governos, sendo que nos últimos 48 anos tivemos 24!

A tática e a estratégia

O balanço do 50 anos explica-nos que que somos pouco dados à definição estrutural do que interessa,  dedicando-nos antes a esta ou aquela medida/promessa/cenoura que, em cada momento da história, parece ter acolhimentos na narrativa coletiva.

Esta tendência está assimilada e em progresso com a imposição de “democracia mediática” repetida à exaustão nos canais por cabo e nas redes sociais.

E é assim que a democracia “tiktok” impõe como realidade aquilo que parece e portanto “é” – ideia peregrina que vem desde o antigo regime e agora se impõe. Estamos na tática. Perdemos a estratégia – coisa que ninguém quer falar.

Acontece que a linguagem em que a política atual  habita tem uma estrutura de divulgação que mais não é do que um escola de ditadores. Não é possível explicar, mas antes afirmar; querendo comentar, impõe-se a limitação dos caracteres. O convite ao like, a estratégia de divulgação apela à emoção (negativo/positiva) para produzir em massa impérios de seguidores.

Estes na ânsia da “informação” permitem aos algoritmos a informação essencial para analisarem as tendências de cada um e assim, de seguida, lhes sirvam de forma simples e adequada o “caminho” a fazer fornecendo-lhes opções “compatíveis” aos interesses de quem os controla. Que melhor descrição para falarmos de “democracia amordaçada”?

As lideranças que temos

É nesta cultura de “democracia amordaçada” que devemos olhar para a crise política que vivemos onde não encontramos nenhum compromisso para a negociação.

Em vez disso, opta-se, na primeira ou segunda oportunidade, para se jogar o destino do país numa aventura que sirva para a chamada  “clarificação política”.

Mas que “clarificação política” se todos verificamos que tudo irá ficar na mesma? E é assim que estamos confrontados com dois intérpretes que, para nossa desgraça, são portadores de um notório  “killer instinct” . É o regresso ao que escrevemos no início deste texto – a linguagem dos vencedores ou afirmação dos vencidos.

Mas o que ganham os portugueses com isso?

A política ao minuto ou a prevalência da tática

Mas tratemos daquilo que nos toca! Mereciam as instituições sociais conhecer desde finais de 2024 o acordo de cooperação para este ano.

À data ainda não há acordo assinado, apesar da informação conhecida no último conselho de ministros extraordinário – o tal do início do processo da confiança.

Registamos que, num momento de alta tensão política, entendeu o Governo disponibilizar-se para o acordo com as instituições, parecendo afinal fácil propor os novos valores.

Disponibilidade portanto para “acordar” num momento em que dá início à “campanha eleitoral” para as eleições de Maio. Prevalece assim a tática mesmo que subsistam dúvidas constitucionais na sua aplicação.

Ou temos uma corrida “last minute” até à apresentação da “moção de confiança” para assinar o acordo ou fica o Governo impossibilitado de o assinar dado que transformado em executivo de “gestão”.

E assim se adia o país na execução de medidas necessárias e prementes e se desconsideram, pelo atraso, as instituições, os seus dirigentes e os  seus trabalhadores.

Por Alfredo Cardoso, diretor de Sociedade Justa

 

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