Eutanásia – o mito da independência absoluta. O debate sobre o fim da vida, pela eutanásia e o suicídio assistido, esquece-se de mencionar as condições de abuso em que os mais velhos por vezes são imersos em situações de dependência que lhes afecta a liberdade de discernimento.
Muitas vezes há pacientes que choram porque vêem a sua situação como um fardo para a família e para as pessoas ao seu redor. Julgam-se indignos porque construímos uma sociedade que os fez acreditar que a dependência, a invalidez, a pobreza, a doença, a reforma, o desemprego ou a velhice são um fardo que pesa sobretudo sobre os outros.
O orgulho de nossa sociedade individualista é, porém, ter mantido o mito da independência absoluta. Basta demorar alguns minutos na nossa vida para perceber que, desde o nascimento até a morte, somos profundamente dependentes uns dos outros. A doença torna tangível e visível o que perpassa a existência de cada um. Por meio de nossas atitudes, muitas vezes involuntárias, todos carregamos parte da responsabilidade pelo sofrimento.
Um véu vergonhoso
Lançamos um véu vergonhoso sobre os escândalos dos nossos lares de idosos, sobre a solidão, sobre as condições de vida degradantes e os abusos. Demos a nós mesmos a consciência tranquila ao sugerir que um leito médico e alguns cuidados extinguiriam a nossa responsabilidade individual e coletiva.
Banalizamos o horror de ver os nossos mais velhos amarrados, permanentemente acamados, pedindo socorro às vezes o dia inteiro, sem que nenhum eco venha atendê-los.
Toleramos, por falta de meios e de tempo, a generalização do uso de fraldas, precipitando na demência os que nela não entraram.
Como não compreender então a angústia, o suicídio e a depressão que atingem os nossos mais velhos?
Como não se animar então a deixar um mundo que não nos quer mais?
No entanto, a principal preocupação da nossa sociedade resume-se tristemente nestes números: 50% das despesas com a saúde são feitas nos últimos cinco anos de vida.
A questão económica vai além do questionamento ético.
Cultura paliativa
A formação médica reserva um lugar quase cosmético tanto para a cultura paliativa como para a prevenção.
A obsessão curativa dos nossos médicos conduz muitas vezes a situações extremas: só recorremos a cuidados de suporte e paliativos quando não sabemos o que fazer com o doente. Essa atitude deu injustamente uma imagem negativa do cuidado que, no entanto, deveria ser lugar-comum.
O poder público não está à altura do desafio do fim da vida: A falha fundamental do debate sobre o fim da vida é ter perdido o essencial: não pode haver discussão sobre a Morte que não seja antes de tudo uma discussão sobre a Vida.
O papel de todos em nossa sociedade
O verdadeiro debate que o fim da vida merece é o do papel de cada um na sociedade.
Mudar o olhar, formar médicos, investir em unidades de cuidados paliativos ou desenvolver o internamento domiciliário.
Hoje, apenas 0,3% dos pacientes em unidades de cuidados paliativos apresentam pedidos persistentes de eutanásia: devemos empenhar-nos para reduzir ainda mais esse número, que testemunha um sofrimento ainda intolerável.
Apesar dos esforços, raros sofrimentos não cedem, devem ser acompanhados de benevolência e compaixão.
A honra de nossa sociedade reside apenas na sua capacidade de fazer todo o possível para ajudar os mais fracos e vulneráveis. Devemos afirmar juntos que não há indignidade na doença ou no sofrimento, dado que a nossa dignidade nunca é medida pelo que somos, é sempre medida pelo que fazemos.
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